sexta-feira, junho 12, 2009

Dois relatos sobre o confronto com a PM na USP

Seguem dois relatos que recebi. O primeiro é de um estudante; o segundo, de um professor.

"Versão de quem esteve presente do início ao fim, mais como espectador do que qualquer outra coisa...:

Lá pras 15h começou o ato no p1, os estudantes, funcionários e professores que estavam no ato, mais ou menos umas 700 pessoas, ficaram cantando, gritando palavras de ordem e confrontando os policiais da força tática (armados com o aparato do choque), jogando flores e mostrando livros. Isso durou umas duas horas, quando surgiram duas propostas: Voltar para a Reitoria e continuar o Ato lá, ou fazer uma "mini-passeata" até a Vital Brasil para depois ir para a Reitoria. Como a votação não deu contraste, houve um racha: um pouco mais da metade foi para a Reitoria (PSTU, Sintusp, independentes), outros ficaram na rua (MNN, independentes) e outros ainda ficaram em dúvida sobre o que fazer (LER-QI, Psol, outros independentes....).

Depois de uns dez minutos de discussão, decidiu-se que este segundo grupo iria voltar direto para a Reitoria, e o transito foi aberto, e os policiais foram se retirando (ou para a Reitoria ou para a Dp). No meio do caminho, os estudantes que voltavam encontraram quatro policiais da PM e começaram a gritar "Fora PM", cercando-os contra um tapume, e depois "empurrando-os" para fora. Esses policiais já estavam saíndo e as pessoas já estavam aplaudindo, quado chegaram umas 4 motos, mais uns 5 carros da PM, mais o Choque em formação e atiraram uma bomba de Efeito Moral. Detalhe: A rua cheia de carros de gente que não tinha nada a ver com isso.

A partir daí foi uma loucura: Muitos estudantes correndo, outros correndo e xingando, outros chamando uma resistência, alguns atirando pedras, alguns tropeçando, alguns sendo atingidos pelos estilhaços das bombas, outros sendo pegos e presos. A gente corria, e parava para ver se a tropa de choque também parava, mas eles continuavam vindo para cima, atirando quatro, cinco ou mais bombas de efeito moral. eles atiravam para cima, então você estava correndo e a bomba passava por cima de você, estourando lá na frente ou do seu lado. Também estavam distribuindo tiros de borracha e umas bombas de gás lacrimogênio mais leves.

Quado chegamos na Reitoria, encotramos o resto do pessoal do ato, e achamos que os policiais iam maneirar.. Mas cotinuaram jogando bombas... Saímos correndo e pensamos que eles iam ficar pela reitoria, mas eles continuaram seguindo. Fomos então para o prédio da História e da Geografia, e ficamos sitiados por lá. O Choque ficou do outro lado da avenida, junto com os carros de polícia que chegavam... umas dez viaturas.

Ficamos na borda do morrinho, alguns estudantes fizeram uma barreira na rua para parar o transito, um professor da pedagogia foi lá para conversar com o tenente coronel e levou spray de pimenta. Depois, alguns professores da Adusp, mais jornalistas e alguns estudantes foram lá também para conversar, mas caiu uma bomba de gás lacrimogênio bem no meio deles(daquelas beeeem fortes, que começa a arder tudo e você não consegue respirar), e os policiais começaram a atirar uma saraivada de bombas de gás no prédio da História. Ah, sim, a rua estava cheia de carros, e o prédio lotado de gente que não tinha nada a ver com o rolo.

A essa altura do campeonato, metade dos dirigentes do sintusp já tinham sido presos, alguns incautos que ficaram pra trás na correria também, e uns 4 ou 5 estudantes estavam no HU, por conta das balas de borracha e estilhaços de bombas.

Ficamos mais umas duas horas "sitiados" no prédio da história, houve assembléia de professores, e depois que o choque maneirou (foi para a reitoria) houve assembléia de estudantes na rua mesmo. Os professores tiraram uma comissão de negociação, e eu fui embora no meio da assembléia de estudantes, porque já tinha dado para mim.

Os estudantes vão pernoitar na usp, que ainda tá cheia de PM.

é isso

Abraços

Chiquetto"



Professor Rogério Monteiro de Siqueira:

"Prezados colegas, amigos e alunos,

estou estarrecido. Nunca pensei que ia viver isso na na nossa universidade. Uma indignação enorme me fez deixar a assembléia de professores no prédio da História e descer correndo para a reitoria. A informação que tinha chegado à nós era de que o batalhão de choque estava soltando bombas sobre os estudantes e funcionários na reitoria.
De alguma maneira, como professor, imaginei ter - junto com outros colegas - a força necessária para arrefecer o conflito. Era preciso evitar o pior, evitar que algum estudante se machucasse. Tínhamos visto nos jornais no dia anterior, policiais com metralhadoras.

Chegando mais perto, uma fumaça enorme, estudantes correndo, e um clima bastante ameaçador. Um aluno passou por nós dizendo que não devíamos ficar ali. Retruquei: Não. Vamos ficar aqui.

Descemos mais um pouco e uma tropa de choque, cacetetes, bombas, spray de pimenta, marchou em nossa direção.
Subimos a calçada, que passem ! Tratava de saber o que de fato ocorria, procurar responsáveis, tentar negociar, verificar se alguém estava ferido. Mais perto, um policial do batalhão - uns quinze - mandou a gente se afastar. Dissemos que éramos professores. Se afastem! gritaram. Somos professores! Eles jogaram spray de pimenta na nossa direção. O Thomás que estava um pouco mais a frente, de carteirinha na mão, recebeu o spray nos olhos. Saímos correndo. Uma bomba de gás caiu a um metro dos meus pés. Parei um pouco e olhei na direção dos policiais com toda a raiva que já pude sentir.

Um policial com uma bomba na mão olhou pra mim. Senti que iríamos receber mais um presente da corporação. Estupei o peito e falei gritando: Você vai jogar na gente? Somos professores! Você vai jogar?
O absurdo era tanto que fui mais absurdo ainda. Como eu podia fazer um negócio desses? Mas fiz.

Não dava mais para ficar lá. Chamei a Vivian Urquidi e o Jorge Machado para subir novamente até à História. O Thomás já tinha saído porque mal conseguia abrir os olhos. Meus olhos também ardiam muito.

Eu só gostaria de saber: o que um professor de carteirinha na mão, um outro com mochila nas costas, pasta em uma mão e blusa na outra, outra professora com uma flor na mão representam de perigo ao patrimônio da USP? Gostaria de saber até onde a tese de preservação do patrimônio se sustenta? Que espécie de comunicação e negociação é essa, que coloca policiais cegos a serviço da Reitoria? Para onde fomos? Para onde foi a experiência de 75 anos em produzir saber?

Saudações acadêmicas.

Rogério Monteiro de Siqueira

Professor Doutor EACH-USP
História e Geometria
http://www.each.usp.br/rogerms
Escola de Artes, Ciências e Humanidades - Universidade de São Paulo
Arlindo Bettio, 1000, Ermelino Matarazzo, 03828-000, São Paulo."

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